Há alguns dias postei um artigo aqui falando sobre o atropelamento do amigo Rafael Pereira na Bicicletada de outubro no Rio de Janeiro.
Como o mais importante de tudo é o Rafael, volto com informações: ele está bem.
Mas o artigo anterior não foi suficiente.
Muitos que foram lá para lê-lo não encontraram o vídeo do acidente. É, ele foi tirado do ar a "pedido" do advogado do motorista que atropelou o Rafael, sob pena de processar o rapaz que fez o vídeo. Também não vou tecer comentários sobre isso.
Desta vez eu volto aqui para transpor o relato da Aline Magalhães (no e-mail que enviei a alguns amigos escrevi Aline Guimarães(!). Aline, mil perdões!), que estava lá, ao lado do Rafael durante todo o percurso em que o motorista os ameaçou.
Eu pedi a ela para postar este relato aqui para que as pessoas possam ouvir de quem estava lá.
Eu vou me restirngir a não fazer muitos comentários, porque o relato já fala por si.
"Nossa, finalmente consegui terminar de ler todos esses emails. E agora sim poder responder.
Nossa, vcs não sabem o alívio que estou por poder finalmente entrar na discussão.
Pq? Pq já me chamaram para essa discussão em milhares de e-mails passados, mas eu queria ler tudo para poder partilhar minhas considerações. Pq me chamaram? Pq eu estava do lado do Rafa e vi "de camarote" o infeliz ocorrido.
Mas primeiro, algumas reflexões:
Justamente por estar ali do lado, sofrendo junto com o Rafa as aceleradas do cara em cima da gente, fiquei extremamente perplexa e agora até triste com tantos e-mails circulados aqui. Tentarei me focar e não deixar que sentimentos mais duros tomem conta deste e-mail.
Me entristece profundamente o ponto que nossa sociedade chegou. O ponto de falta de amor, falta de respeito e falta de sensatez. Esse individualismo predominante está dando abertura para essas tantas justificativas que - na verdade - a nada justificam.
Nosso povo, nossa sociedade vive uma loucura frenética, pela pressa, pela falta de amor, pelo descaso com o próximo, pela agressividade, pelo egoísmo, e por aí vai.
E para mim a culpa é dessa sociedade (e de nós mesmos que a produzimos) por produzir esse mundo tão violento e "desgraçado".
Dito isso, a ação do referido motorista foi uma violência sem justificativa, não tenho outra palavra que caiba melhor para expressar o que foi.
O que ele queria? Ele ia chegar mais cedo por "acelerar o Rafa".
Galera, eu estava ao lado. O cara ficou acelerando em cima. Quando finalmente ele FEZ a merda, fiquei perplexa. Não acreditei. Ele podia ter passado para a outra pista. Não, escolheu ficar atrás da gente de sacanagem com a gente.
Narrando o que ocorreu, principalmente para quem tanto diz que não estava lá para ver. Se é que isso vai fazer alguma diferença, pq vão querer saber mesmo dele (do motorista) o que aconteceu. Talvez ele estivesse com pressa pra dar a luz, né!? (e não era o caso, nitidamente comprovado)
Saímos do Tunel Velho em direção a Santa Clara. Essa rua é uma descida que não precisa nem pedalar (pra quem nao tem fixa, né!? rs) e a gente já ganha uma velocidade consideravel. Pedalo naquela rua umas 2 vezes por semana.
Então, quando entramos, natural que o grupo da frente ganhasse velocidade sobre os demais. Taí um ponto que falhamos. Mas na boa, vocês me desculpem, mas vão catar coquinho na esquina. Quem nunca errou que atire a primeira pedra.
O ocorrido é bom pra gente aprender e lembrar a importancia de estarmos juntos, em massa, em bloco, agora como um trem e não somente um ônibus. ;)
Esses buracos existem nas bicicletadas e devem ser minimizados ao máximo, suprimidos se possível. Mas acontecem, e até agora não tinha dado nada.
Voltando...
Com um povo para trás o que é mais importante fazer? Garantir que o povo da frente segure e que o povo de trás junte. (se não me engano alguém teve um probleminha, por isso ficou pra trás).
Vi um carro branco (palio) passando... Pedi para que ele segurasse um pouco para que o povo se juntasse... E enquanto isso gritava pro povo da frente segurar e o povo de trás avançar. Algum ciclista chegou junto e vi o felizardo (do carro preto) passando, sei lá de onde surgido. Fui pra frente dele pedir para que ele segurasse. Ele estava na pista que estava a massa mais adiante.
Ou éramos nós, ou era a galera na frente. Indifere.
O cara não quis mudar de pista, quis apenas acelerar em cima da gente.
Pois é... depois de umas 3 aceleradas com o carro, ele se sentiu no direito de "empurrar" o Rafa para andar mais rápido.
Ou passar por cima do Rafa para andar mais rápido.
Tanto faz. O que ele fez é injustificável. A defesa dele? É que o carro era hidramático e ele perdeu o controle. Po..a, se não tem controle, nao dirige! Vai pra uma psicóloga tratar da sua falta de controle. Imagina o q ueesse desgraçado, como tantos outros diariamente fazem no trânsito? É o que vivemos TODOS os dias, VÁRIAS vezes ao dia. Só que não são noticiados e revistos.
Eu vi acontecendo ao meu lado a cena de Porto Alegre, só que em proporções MUITO menores, graças a Deus.
Pra quem viu o video de lá, considere a mesma situação, ok!?
Eu estava ao lado, eu vi o vídeo. Não vejo diferença.
A diferença é o grau de loucura e falta de controle que os dois motoristas tinham. Pra nossa sorte o motorista do Rio tinha um controle melhor.
E numa boa.
To quase perdendo a minha paciencia, infelizmente.
O Rafa foi um gentleman, e a massa também. Violência? Você não tem ideia do que é violencia né!? Conceitos muito alterados.
O que estava ocorrendo era um povo indignado, gritando. Usando a palavra para expressar a energia que tinham em suas almas. Porque a vontade real poderia ser linchar o cara ali mesmo.
E tenho certeza que se fosse em outro grupo isso facilmente teria acontecido. Mas vejo bem que estamos sendo cordiais e elegantes no trânsito. Fico feliz com isso. Que da próxima vez que isso acontecer possamos chamar o cara para tomar um café, ou melhor paguemos um café para ele para ele contar seus problemas e limites que levaram ele a fazer aquilo naquele momento.
Francamente...
É, acho que nao consegui ser feliz no meu email.
Mas eu estava ali do lado. Não fosse o Rafa, era eu, não fosse eu eram as pessoas que estavam mais a frente.
Bem, proposições....
Para a próxima bicicletada balões de coração e flores.
Que possamos desenvolver ainda mais amor em nossos corações para trilharmos outros passos nessa humanidade.
Que tenhamos sempre esse equilibrio e tranquilidade para lidar com as situações mais complicadas e difíceis que enfrentemos.
E parabéns à toda a massa pela capacidade de se orientar no momento do fatídico atentado.
Aos que não sabem: assim que passou a nossa atordoação natural pelo ocorrido, buscamos liberar imediatamente a pista para que o trânsito fluisse, não podendo apenas modificar a cena do crime, né!?
OBS: essa bicicletada foi a fantasia. Não é sempre assim.
A cada uma, tentamos pensar algo novo para a bicicletada, às vezes conseguindo, às vezes não. Mas é sempre uma nova experiência, com seus erros e acertos, e que possamos JUNTOS construir cada passo, cada rota, cada ideia, cada força.
Quero muito mudar esse mundo. Que possamos começar dentro de nós e desculpem ter sido tão indelicada nesse e-mail. Mas sou humana como todos, com muitas falhas e limitações que nem sempre me permitem ter a perfeição do amor, harmonia e paz com meus irmãos de luta.
Agradeço aos e-mails centrados e pontuados por diversos amigos aqui. Não citarei nomes, pois depois de quase 50 e-mails, com certeza esquecerei de alguns.
Vocês fizeram diferença na leitura de tantos e-mails.
Obrigada a todos pela contribuição. E que a principal contribuição seja a mudança de nossas vidas!
Beijos e uma ótima tarde a quem me lê e conseguiu chegar até aqui.
Aline Magalhães"
Apenas contextualizo: este é o texto de um e-mail enviado por ela para a lista de discussão da bicicletada. Ele fala por si. Claro que publiquei com a devida autorização da Aline.
Eu fico por aqui, e vocês com estas imagens na cabeça...
Até o próximo...
Não deixe de ver também o artigo do Rodrigo Primo, com links para outros relatos
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